Na minha visita ao MUSEU DA LOUCURA, me deparei com uma realidade que poderia ter sido a minha. A cada sala, engolía seco e seguráva as lágrimas. Ver fotos, ler relatos e ouvir áudios de pacientes me transportava, de alguma forma, à realidade dos pacientes psiquiátricos de Barbacena. Um lugar onde era o destino de milhares de pessoas como eu (negro, pobre, órfão e autista).
Por muitos anos, o Hospital Colônia de Barbacena foi “referência” nacional em “tratamento” de pessoas com doenças psiquiátricas, tanto que Barbacena teve a alcunha de “cidade dos loucos”. Mesmo tendo na sua população mais de 70 % dela não apresentando nenhum estado mental que justificasse a sua permanência lá
O Hospital começou a funcionar em 1903, com o nome de Azylo Central de Barbacena. Em 1911, transformou-se em Hospital Colônia de Barbacena. A partir daí, milhares de pessoas eram encaminhadas para, teoricamente, serem tratadas naquele hospital.
Trens chamados de “trens de loucos” chegavam cheios de pessoas para serem internadas, muitas abandonas pelas famílias. Com capacidade para 200 pessoas, hoje nem se sabe ao certo quantas pessoas passaram por lá, tamanho era a preocupação com cada paciente, que valia mais morto do que vivo.
Superlotação, condições desumanas, doenças. Fácil entender porque cerca de 700 pacientes morriam por ano. Logo, outro fato começou a ficar comum: corpos começaram a desaparecer “sem explicação” – iniciou-se um comércio ilegal para faculdades de medicina.
Quanto mais entrava no museu, mais mergulhava nessa história tão triste. Os pacientes eram trancados em celas, algemados, tinham que comer com as mãos e muitos ficavam nus. Em 1930, um diretor sugeriu o chamado “leito único”: camas foram retiradas e todos dormiam no chão ou em montes de capim dividindo os espaços com ratos e vários insetos. Mas todos tinham que acordar as 5horas da manhã e ir para o pátio gelado sem roupas ou qualquer proteção da fria neblina da Serra da Mantiqueira. Dizem que era para colocar o capim para secar das fezes urina e retirar os mortos que não conseguiram suportar a noite fria.
O modelo de leito único deu tão certo que o próprio governo o recomendou, em 1959, para outros hospitais mineiros.
As condições a que eram submetidos os pacientes eram a mais degradantes possíveis. Banhos gelados, eletrochoque, lobotomia. Não havia dignidade. Não havia cuidado. Não havia esperança nem para as crianças que eram tratadas igual os adultos. O hospital chegou a ser comparado a um campo de concentração nazista por um psiquiatra italiano que o visitou, tamanha a desumanização daquele lugar.
Tornou-se um verdadeiro depósito de gente. Pessoas rejeitadas, excluídas, indesejadas. Pessoas que eram torturadas. Vi as algemas, o aparelho de eletrochoque, o picador de gelo usado para se chegar até o cérebro na lobotomia, cirurgia irreversível que desconecta algumas áreas do cérebro. Ouvi áudios de pacientes gravados pela imprensa, quando as denúncias começaram a surgir. Gritos, cantos e também relatos aparentemente bem lúcidos de pessoas contando como foram parar ali, já que com o tempo qualquer ser indesejado era mandados para lá. Estima-se de 60 mil pessoas tenham morrido e quase 2000 corpos tenham sido vendidos.
Pude visitar o cemitério que foi desativado devido o excesso de corpos, a terra não conseguia absorver a crescente demanda de adultos e crianças que foram enterrados como “IGNORADOS DE TAL”.
Em 1958, começaram as primeiras denúncias. Em uma sala dedicada a este fim, vi as notícias do jornal da época, como a famosa matéria “Nos porões da loucura”. Foi feito também um documentário chamado Em Nome da Razão.
Essas denúncias demoraram quase duas décadas para começar a surtir efeito. Somente em 1980, o hospital foi fechado. Profissionais da área da saúde mental e direitos humanos começaram a se manifestar. Em 1987 foi instituído o dia 18 de maio como Dia da Luta Antimanicomial. Mas segundo funcionários faz somente 4 anos que realmente o Colônia encerrou o seu funcionamento pra valer.
O Museu da Loucura é daqueles espaços, assim como museus dedicados à inquisição, ao holocausto, à escravidão e à ditadura, que são necessários para nos fazer refletir e lutar para que atrocidades como as que foram cometidas vão deixando de existir, eu digo vão deixando, sem falar nas organizações que modernizaram a maneira de institucionalizar aqueles que são indesejados socialmente.
Para te deixar refletir e pensar sobre como podemos fazer mais para mudar esta realidade, quero deixar alguns vídeos para te trazer um pouquinho das experiências e aprendizados que tive nesta prévia do MAIOR MANICÔMIO DO BRASIL.
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